Atravessar uma rua

A sociedade não é deficiente.

Características humanas não são adjetivos.

Por isso o nó não é cego.

Nem é capenga um projeto que não vai bem.

Assim como não é surda aquela pessoa que insiste em não aceitar seus argumentos.

Deficiência não é doença.

Deficiência é uma condição humana.

Deficiência não é sinônimo de falta.

Deficiência não é sinônimo de imperfeição.

Deficiência não é sinônimo de algo vazio ou incompleto.

O contrário de eficiência é ineficiência.

Há pessoas com deficiência eficientes e ineficientes em uma ou em muitas perspectivas.

O diferente não existe.

A diferente também não.

Porque todo mundo é infinitamente diferente. A deficiência é uma diferença que dialoga com todas as outras. Pra sempre. Não existe deficiência pura. Toda deficiência é composta. Toda deficiência depende. Toda deficiência é mutante. Nenhuma deficiência é binária. Inclusão não é colocar pra dentro quem tá fora. Quem ama também discrimina. Libras sem legenda tá mais na linha do marketing. Auto descrever-se no início das lives não é audiodescrição. Discriminar não é apenas eliminar acesso a bens, serviços e direitos. Discriminar também é dar direitos em excesso, que deixam de ser direitos. Lágrimas não mudam o mundo, mas deixam feliz quem chora. Superação é palavra utilizada quando se espera muito pouco daquela pessoa.

Pessoas com deficiência têm direito ao planeta todos os dias, e não apenas em dias de festa. Direitos atrapalham quando nunca se teve acesso a eles? Há pessoas com deficiência que nunca foram sujeitas de direito. Há pessoas com deficiência que não sabem o que é inclusão. Há pessoas com deficiência que não querem inclusão. Especial é a palavra que a sociedade usa para designar alguém que ela acredita estar em muita desvantagem e, consequentemente, sempre será um ônus para ela. A exclusão é um exercício sem fim. O último estágio de quem se habitua a excluir é o desejo de matar. Nada é inclusivo se não for plenamente acessível. A inclusão é um exercício sem fim. 

O último estágio de quem se habitua a excluir é o desejo de matar. O último estágio de quem se habitua a praticar a inclusão é a sociedade inclusiva. Não há prêmios para quem pratica inclusão. Ainda assim, é o único caminho para uma sociedade plena de direitos. Discriminar se aprende. Não discriminar também se aprende. 

Mas quem vai ensinar? 

Nem toda discriminação é crime. 

Toda discriminação é criminosa. Discriminação doi. 

Discriminação empobrece. 

Obrigado Sra Oméria por permitir que eu a auxiliasse sua neta em sua cadeira de rodas. Isabela mora em meu coração e eu. 

Eu? Vi o quanto posso ser útil dando um pouco de tudo que recebi em minha infância.